Em Junho de 2016 aconteceu a 3a Maratona Academia PDJ. Esta é uma maratona online de desenvolvimento que eu faço com os membros da Academia de Produção de Jogos e tem como objetivo fazer o pessoal realmente colocar a mão na massa e usar tudo o que aprendeu na criação de um jogo.
Se você não faz nem ideia do que é uma maratona de desenvolvimento (as famosas “game jams”), sugiro a leitura do artigo Game Jams: o que são, Porque são Importantes e como Participar. Você pode também ver as entrevistas que eu fiz com os participantes da 1a Maratona Academia PDJ ou os jogos da 2a Maratona Academia PDJ que foram publicados na Souking.
No artigo de hoje, eu trago o postmortem do jogo The Last Demons, desenvolvido em 10 dias (incluindo a criação de materiais de marketing, como o presskit e o site) durante a 3a Maratona Academia PDJ.
The Last Demon foi desenvolvido pela equipe Iapôis Game Studio, formada por 4 pessoas do estado do Alagoas (daí o nome da equipe hehe). Confere aí o trailer do jogo:
Eu acredito que o postmortem abaixo será muito útil para quem desenvolve ou quer desenvolver jogos, pois discute as várias as fases do processo, as dificuldades e desafios da criação, o gerenciamento de tempo e outros pontos importantes.
No final do postmortem eu volto para fazer alguns comentários, contar um pouco sobre a 4a Maratona Academia PDJ que começou nessa semana e te explicar como você pode fazer parte da Academia de Produção de Jogos.
Então, meninos e meninas, divirtam-se com o postmortem do jogo The Last Demon.
Com vocês, Iapôis Game Studio
E aí pessoal, tudo joia?
Aqui é o Carlos W. Gama, líder da equipe Iapôis Game Studio, que criou o jogo The Last Demon na maratona de 10 dias da Academia de Produção de Jogos. Estou hoje aqui a convite do Raphael Dias para representar minha equipe e contar para vocês como foi o processo de desenvolvimento do game.
Caso ainda não conheça o jogo The Last Demon, pode jogar diretamente pelo seu navegador no link abaixo:
Agora, bora lá! 😉
Origem da Equipe
E, afinal de contas, como a equipe surgiu? Bom, para a maratona da Academia PDJ seria preciso criar uma equipe no máximo 5 pessoas possuindo um líder e um estagiário.
Partindo daí, já existiam alguns membros em mente, e estava na hora juntá-los. Um amigo meu e seu colega haviam entrado para na Academia PDJ nessa turma por indicação minha (eu entrei na segunda turma do curso em 2015).
Com isso, já tínhamos 3 membros, sendo um programador (Eu), um roteirista (Diogo Gêda) e um estagiário (Jonney Carvalho), então precisaríamos agora buscar por um artista e um músico para completar a equipe.
Para a função de artista, eu já tinha em mente a Ingrit que entrou na Academia PDJ na primeira turma. Eu já conhecia seu trabalho e já havia trocado algumas palavras outras vezes, inclusive que na próxima maratona (a atual) eu iria querer ela na minha equipe.
A Ingrit é do tipo tímida, mas possui um dom incrível. No início ela ficou com receio devido ao prazo e achar poderia não dar conta, prejudicando assim a equipe, mas para nossa alegria ela aceitou.
Isso mostra para você não olhar apenas para o óbvio, como procurar apenas nos novos membros, que também são muito bons, mas também ter uma visão mais ampla e ver outras possibilidades como os membros das turmas passadas que não são ativos na comunidade.
Por fim corremos atrás de um membro para trabalhar com os áudios e músicas do jogo, mas infelizmente não conseguimos ninguém pois haviam poucas pessoas para essa função e todas já estavam com equipe ou sem tempo. Então resolvemos seguir em frente nós quatro.
A equipe ficou dividida comigo na programação e coordenação da equipe; Diogo Gêda no roteiro e Game Design; Jonney no estágio dando suporte em diversas atividades com sugestões, presskit e depois se especializando no Level Design do jogo; e por fim a Ingrit na direção de arte.
Apesar dessas divisões de cargos a equipe foi bem unida e todos podiam dar ideia de como o jogo seria, o que foi bem bacana.
A escolha do nome da equipe foi um fácil, pois todos os membros eram do mesmo estado (Alagoas), embora não das mesmas cidades. Alagoas é um estado onde você não vê incentivo para a produção de jogos, ninguém fala sobre isso e ainda assim conseguimos formar uma equipe, então se seu estado também é assim, não perca as esperanças.
Como todos estavam próximos, pensamos em usar alguma palavra do dialeto daqui, e olhe que há bastantes palavras. No fim escolhemos o nome Iapôis com um coqueiro por sugestão do Diogo, por lembrar as praias pelas quais a região é conhecida.
A escolha do tema
Para a maratona, o Raphael Dias liberou três possíveis temas e todos pareciam ser mais fáceis relacioná-los com o gameplay do jogo do que com o roteiro.
Assim, o membro Diogo recomendou a gente pegar o tema “Quem pensa pouco, erra muito”, pois seria mais fácil trabalhar com jogos de puzzle.
Daí por um motivo o qual a gente não lembra, me veio à cabeça um jogo que eu gostava muito na época do Windows 98 e que o Diogo também conhecia da época do Orkut: um jogo no gênero Sokoban, onde o personagem tem que empurrar caixas preenchendo todos os pontos do nível.
Todos curtiram a ideia e no dia seguinte já começamos a fazer os testes. O primeiro teste foi a escolha da engine, pois o ideal seria uma engine fácil onde todos pudessem colaborar, pois apenas eu havia conhecimento um pouco mais avançado nas engines e programação, e tanto o Diogo quanto o Jonney estavam dispostos a dividir a carga comigo.
A primeira engine escolhida foi a Construct 2, devido a sua programação ser visual e em blocos, em vez de linhas de código. Entretanto, observamos que apenas para mover o personagem e as caixas haviam sido usados 28 eventos (a parte de programação do Construct) e a versão gratuita libera apenas 100 eventos, sendo que para este jogo gastaríamos no mínimo 300 eventos.
Ainda havia muito mais coisas que gostariam de adicionar, então após debater com a equipe ficou decidido que usaríamos realmente a Unity.
Protótipo da Construct 2:
A vantagem da Unity seria a liberdade para construir o jogo como quisesse sem limitações.
A desvantagem seria que apenas eu teria condição de trabalhar diretamente com a engine por 90% dela funcionar por meio de programação além de atualizar o jogo adicionando tudo que fosse criado pelos outros membros como falas, imagens e o cenário. Mas aceitamos o desafio e resolvi criar a estrutura dos códigos de forma que os outros pudessem usar os scripts prontos sem precisar mexer em seus códigos.
O processo de desenvolvimento
Definido o tema e a engine, começou o processo de desenvolvimento. Eu comecei a criar os scripts e os modelos dos objetos no jogo de forma que funcionasse como um clica e arrasta.
O Diogo começou a criar os personagens, falas e documentar as ideias no GDD. Jonney ficou responsável por criar também os níveis do jogo em forma de desenho, e a Ingrit por desenhar os personagens e imagens das cutscenes.
Na parte dos desenhos, como a Ingrit sentiu indecisão do que desenhar, definimos o número de imagens que o jogo teria e usamos o Pinterest para armazenar imagens de referência ao que ela poderia se basear. A aparência forte dos desenhos dos demônios foi baseada nas descrições dos 72 demônios goéticos de Salomão, mas ainda assim a Ingrit surpreendeu bastante com o resultado final.
Durante as ideias iniciais e amadurecimento do desenvolvimento ficou decidido que o enredo envolveria a história de uma exorcista que buscava a vingança contra um demônio que matou seu pai, passando por 4 cenários diferentes (Cemitério, Floresta, Caverna e Limbo); 4 chefes (Demônios enfrentando no jogo); diálogos entre a personagem e os demônios; e duas cutscenes com imagens estáticas, uma no início do jogo e outra no final. O enredo teve como inspiração séries como Supernatural e documentários.
Nessa etapa de desenvolvimento, eu e o Diogo éramos o que mais tínhamos tempo livre na semana, por isso podíamos dedicar às vezes até mais de 12h por dia. Jonney e Ingrit trabalhavam e estudavam, por isso só tinham o tempo da noite livre. Eles até queriam participar mais, a ponto de faltar as aulas para se dedicar a produção, mas éramos contra pois não queríamos que ninguém saísse prejudicado.
Após ter a estrutura inicial do código do personagem empurrando as caixas para os pontos, a possibilidade de adicionar as falas e imagens simplesmente digitando e selecionando, chegou o momento de adicionar as fases que o Jonney havia criado.
Ao montar o cenário no jogo foi observado que apesar das fases estarem bem legais, ainda estaria fácil se o jogador não tivesse nenhum fator a mais de dificuldade. Daí foi sugerido adicionar um contador de forma que o personagem teria um tempo para resolver o puzzle, então criei dois protótipos.
O primeiro com um contador:
O segundo que surgiu de um mal-entendido. Na história original a personagem principal iria invocar os demônios para buscar informação sobre a morte de seu pai, porém eu havia entendido que ela iria enfrentar os demônios para buscar essa informação.
E como eu gosto de jogos que misturam diferentes mecânicas como o caso do Block Legend (que mistura um estilo de Candy Crush com RPG, como pode ser visto na figura abaixo), eu resolvi criar um sokoban com elementos de HP e Estamina.
Nesse protótipo criado pensei em limitar o número de passos para o menor número possível para resolver a fase sendo a estamina do personagem. Quando a estamina acabasse, cada passo dado o personagem iria perder HP e só recuperaria após completar um cenário inteiro (cada cenário tem 5 fases).
Protótipo de Batalha do jogo
OBS: Todas imagens usadas no protótipo eram apenas ilustrativas
Mostrando os dois protótipos para o pessoal, a equipe terminou gostando mais do sistema de batalha e o enredo que seria invocação passou a ser uma batalha contra os demônios. Ou seja, a mecânica principal do jogo praticamente surgiu da necessidade de tornar os níveis mais desafiadores e de uma falha no entendimento do enredo.
Quanto ao nome do jogo também foi uma das últimas coisas a ser decidida, onde surgiu com base na cutscene final do jogo. Por tanto se quiser entender, terá que completar o jogo.
Dificuldades
E não, não foi um processo sem dificuldades. Foi uma semana bem intensa, durante a etapa de desenvolvimento a gente ia dormir entre 4h e 7h da manhã para acordar as 9h, e já voltar a pegar no jogo. O cansaço mental nos últimos dias já estava bem forte.
A programação responsável por mover o personagem foi alterada umas 3 vezes para otimizar e corrigir falhas graves que foram observadas. Scripts prontos tiveram que ser modificados para atender novas demandas, como criar efeitos nas cutscenes. O que parecia ser fácil de ser feito na programação, foi mais complicado do que parecia na hora da produção.
Houve contratempo como o aniversário da Ingrit cair na semana da maratona, se tornando impossível ela trabalhar no dia, problemas com computador lento, saber o que pôr ou não dentro do escopo do jogo.
Gostaríamos de colocar muito mais coisas no jogo como objetos que causasse danos ao personagem, mas sabíamos que o tempo era curto, então tínhamos que focar no mais simples possível, e depois da maratona caso a equipe fosse a favor adicionaríamos os outros recursos que pensamos.
Buscamos por assets free para os áudios, depois normalizamos o volume de cada música, pois umas eram muito baixas, outras altas. Cortamos as músicas, criamos o trailer, enquanto carregava outras coisas.
O tempo disponível que a Ingrit tinha era bem limitado e muita coisa para fazer, então tivemos que correr atrás das imagens do cenário como a textura do piso, as rochas, arvores, enquanto ela focava nos personagens e imagens das cutscenes.
O Jonney ajudou bastante adiantando a estrutura do presskit, para contornar os contratempos, enquanto eu montava o trailer, exportava o jogo e criava o template da página do jogo.
Na hora de disponibilizar o jogo no bitballoon descobrimos que o jogo era grande demais (cerca de 70mb) para o site, então tivemos que disponibilizar temporariamente num servidor nosso que não suportava tantas visitas, mas deu tudo certo no final.
Conclusão
No final das contas, o jogo foi concluído e gostamos bastante do resultado.
Eu mesmo já tinha experiência com engines, desde pequeno mexia com RPG Maker, migrei para outras engines e até criei um site onde ensino as pessoas a criarem jogo com a Unity, mas nunca havia criado um jogo completo para disponibilizar ao público.
Foi bastante interessante tanto para mim quanto para equipe toda. Não apenas pela produção do jogo, mas sim pelo vínculo criado pela equipe, que para mim é o principal ponto de uma jam: formar uma equipe em que você possa se sentir bem e confiar nos membros de sua equipe.
Até hoje não sabemos se alguém fora da equipe já chegou a concluir o jogo, pois ele ficou bem desafiador, mas num futuro montaremos um placar global para sabermos quão longe cada jogador foi.
Já as nossas sugestões para equipes que estão começando são:
- Busque usar um controle de versão do seu jogo, isso permite que pessoas mesmo em locais diferentes possam trabalhar no código atualizado sem causar conflito. Graças a isso, após o jogo criado e estruturado, o Diogo – responsável pelo roteiro – pôde fazer ajustes nos diálogos sem necessitar passar o conteúdo por mim
- Aproveite o máximo dessas jams para conhecer sua equipe. Mesmo que um jogo não seja concluído ou um sucesso, não se preocupe, pois isso vem com o tempo. O mais legal de uma jam é você conhecer melhor as pessoas, você pode até encontrar os sócios para uma empresa que você pense em abrir.
Por fim, toda a equipe gostaria de agradecer ao Raphael Dias pela oportunidade. Do contrário, poderíamos nunca encontrar outras pessoas (até mesmo do nosso estado) que compartilham o mesmo desejo e paixão por produção de jogos.
Se tiver alguma dúvida ou quiser falar diretamente com a equipe, abaixo estão os nossos contatos:
- Carlos W. Gama (Facebook, LinkedIn, Jogos Indie)
- Diogo Gêda (Facebook, LinkedIn)
- Ingrit Lima (Facebook, Behance)
- Jonney Carvalho (Facebook)
Comentários Finais (por Raphael Dias)
Opa, voltei aqui para fazer uns comentários finais e te perguntar uma coisa (mais abaixo, no final deste texto)!
Curtiu o postmortem? Eu gostei demais e fiquei muito feliz em ver que todo o esforço da Iapôis Game Studio se converteu num jogo maneiro como o The Last Demon.
Se você também quer começar a desenvolver jogos, eu sempre recomendo começar dos mais simples para ir ganhando experiência.
Eu criei um ebook com uma seleção de 16 jogos simples para você ter como uma referência sobre o tipo de jogo que eu acredito ser ideal para quem está começando.
Além disso, também incluí a quantidade de cópias vendidas de cada um desses jogos (dados reais vazados da Steam).
Baixe o ebook gratuitamente no botão abaixo:
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Opa,
qual foi a maior sacada que você teve? Conte nos comentários.