Olá! Seja bem-vindo ao último artigo da nossa série sobre carreira em jogos no Japão!
Se você ainda não leu algum dos artigos anteriores, você pode acessá-los abaixo:
- Artigo #1: 6 Razões Para Tentar Uma Carreira de Jogos no Japão
- Artigo #2: 4 Histórias de Quem Estudou Games no Japão – E Como Você Pode Fazer o Mesmo
- Artigo #3: 4 Caminhos Quase Desconhecidos Para Trabalhar Com Games no Japão (o #2 é o Meu Favorito!)
Neste quarto e último artigo da série sobre carreira de jogos no Japão, a Juliana Chavantes vai falar sobre:
- Como os jogos se incluem na rotina diária dos japoneses;
- Os gêneros de jogos mais populares no Japão;
- O mercado indie japonês.
Agora vamos ao quarto e último artigo da nossa série sobre carreira no Japão!
Com vocês, Juliana Chavantes
Como você definiria a sua relação com jogos?
Não precisam ser somente os eletrônicos. Podem ser até mesmo os inventados quando éramos crianças.
Até mesmo os mais neuróticos: lembra de você andando do lado da sua mãe e pisando só no chão branco ou no chão escuro?
Criar jogos faz parte da natureza humana. Eles se incluem em nossas vidas não por serem brincadeiras, mas sim por criarem uma realidade paralela.
Novamente: as pessoas jogam jogos para se divertir numa experiência paralela.
Lembra daquele dia, cheio de estudos e de trabalho, em que você chegou em casa ávido por uma partida de Dark Soul? Pense alguns meses atrás, você estava enfrentando o boss Capra Demon. Entrou na sala do chefe. Morreu. Depois, você morreu exatas 37 vezes. Matou um dos cachorros. Morreu. Lascou seu controle de Xbox depois de lançá-lo ao chão… Depois de mais 8 mortes, você encontrou aquele cantinho esperto e – Aleluia! – matou o Capra Demon.
Sim, é esse sentimento de superação que tanto alimenta o espírito humano.
Não é preciso que seja Dark Soul. Pode ser Minecraft, Pokémon, League of Legends…
Agora, vamos voltar à pergunta original: Qual a sua relação com jogos?
Os jogos em geral, mas especialmente os eletrônicos, têm como principal propósito entreter. Aqui no Ocidente, quando as grandes produtoras de jogos pensam num novo lançamento, o principal aspecto a ser levado em conta é a cultura local.
Por exemplo, você já deve ter percebido que a grande maioria das franquias americanas como Call of Duty, GTA e Dragon Age possuem mundos extremamente vastos, que priorizam a exploração e desbravamento do ambiente por um único indivíduo: você.
E toda a história gira em torno da sua pessoa. Isso porque a cultura americana tem fortes laços com os valores individualistas, de que o sucesso é fruto de um esforço pessoal.
Esta é uma das principais razões para as grandes produtoras daqui não arriscarem muito em desviar dessas mesmas temáticas.
E este pensamento estratégico não pertence só às grandes franquias: todo jogo deve ser planejado com o mínimo de estratégia de venda, mesmo que dentro de um segmento. Aqui, no Produção de Jogos, o Raphael explora justamente este aspecto: como tirar proveito do seu jogo indie mesmo que ele seja para um nicho de mercado específico dentro de uma cultura específica.
(Nota do Raphael: veja por exemplo o artigo onde mostro quanto ganhei com um simples jogo de mesa para Mac: “Como ganhei R$ 2.419,00 vendendo um jogo produzido com R$ 87,00 e dois dias de trabalho“)
Voltando ao Japão, se você quer trabalhar com jogos japoneses, seu primeiro passo será conhecer o mercado local. Ele não só atinge os principais gostos do público como também características intrínsecas à moral japonesa, como o cooperativismo e o coletivismo. Fora esse valores, há também os hábitos diários: para a sociedade japonesa, jogar jogos está muito além da jogatina do final de semana. Nesta nação, de uma forma geral, os jogos não são mais um hobbie, eles constituem o hábito de toda uma população.
Se você quer trabalhar neste país, é preciso que entenda bem essa diferença. Os jogos japoneses estão profundamente ligados às interações sociais entre as pessoas e definem as formas delas se relacionarem entre si.
Neste artigo, você entenderá como ocorre a presença dos jogos na sociedade japonesa e verá como explorar ao máximo as oportunidades deste mercado.
Os 5 Gêneros de Jogos Mais Populares no Japão
É preciso cautela quando dizemos conhecer os jogos japoneses.
Aqui no Ocidente, na verdade, o que conhecemos são as franquias de sucesso japonesas ou as com maior capacidade de adaptação ao mercado Ocidental.
Se Bravely Default (Nintendo 3DS, 2012) chegou até aqui, é garantido que um dos grandes responsáveis por essa abertura foi a franquia de RPG Final Fantasy, bem recebida aqui desde os tempos de NES.
O processo de localização dos jogos é cuidadosamente pensado no intuito de evitar gastos sem retorno financeiro. Por conta dessa cautela (ou falta de orçamento), há diversos gêneros de jogos que mal se veem por aqui.
Contudo, o sucesso em terras nipônicas não garante o mesmo desempenho no outro lado do globo.
1. RPG (Role-Playing Game)
Talvez a maior diferença entre os RPGs Ocidentais e Orientais seja a relação estabelecida entre avatar e mundo explorado.
Se observarmos com cuidado, os RPGs japoneses sempre começam apresentando um personagem cuja história já está pré-estabelecida. Mesmo que você modifique o personagem no início, alterando a cor do cabelo, dos olhos, etc, a história a ser seguida está definida e cabe a você chegar até o final dela.
Em casos mais elaborados, há jogos como Chrono Trigger (SNES, 1995) que lhe dão a possibilidade de criar caminhos diferentes, mas nenhum deles se afasta realmente do final verdadeiro do jogo, que é derrotar Lavos. Outra característica forte é a importância dada à formação de grupo (party).
Raramente você finalizará um RPG japonês sozinho, com a maioria nem havendo esta opção. Novamente, isto se relaciona a cultura do coletivismo.
2. Romances Visuais (Visual Novels)
Aqui, a palavra “romance” não quer dizer relação amorosa, mas sim, a forma literária do gênero narrativo que apresenta uma história completa, com temporalidade, ambientação e personagens claramente definidos.
Os romances visuais resgataram dos livros as histórias, a imaginação e os textos, adaptando-os ao formato do jogo eletrônico. A maior característica deste gênero é o poder do jogador de tomar decisões e como elas definirão o destino da sua personagem. Em poucas palavras, a diversão está em testar as diversas possibilidades de “o que vai acontecer se eu fizer isso?”.
Alguns representantes deste gênero que chegaram ao Ocidente são o suspense 999: 9 Hours, 9 Persons, 9 Doors (DS, 2009 – saiu em 2014 para iOS) e a série de aventuras Phoenix Wright: Ace Attorney (GBA, DS e 3DS, 2001-2014).
Na web você pode encontrar diversos títulos traduzidos por fãs, mas todos em inglês.
3. Simulação de Vida (Life Simulation)
Enquanto que os romances visuais se focam nas escolhas feitas durante a narrativa, os simuladores de vida concentram grande parte do gameplay na rotina do personagem: o que ele irá comer, com quem ele irá conversar, se ele irá atender a um pedido ou não.
A diversão está em construir o seu personagem e descobrir que tipo de relação ele estabelecerá com o universo do jogo.
Um dos primeiros representantes deste gênero que chegou a vir ao Ocidente foi Princess Maker (MS-DOS, 1991). Neste jogo, você decide desde a data de nascimento de sua filha (que é a princesa) até a dieta que ela seguirá.
A variedade de finais é realmente divertida: sua filha pode, inclusive, virar uma marginal do crime, em resultado ao tipo de orientação recebida por você. Vale a pena testar.
4. Doujin Fighters (Jogos Indie de Luta feitos por fãs)
São jogos de luta baseados em títulos já existentes. Estes jogos representam uma característica muito particular no Japão, que são os direitos de imagem.
Enquanto que países como os EUA possuem uma política de uso de imagem extremamente rígida, o Japão caminha para o outro lado: jogos e quadrinhos de títulos existentes são constantemente readaptados por fãs nas mais diversas mídias.
Uma das mais populares são os doujin fighters, feitos por desenvolvedores indie. Devido ao caráter doméstico, o nível de qualidade desses jogos varia, desde os mais grosseiros até os de resultados impressionantes, como Vanguard Princess (Windows, 2009) ou Melty Blood (Windows, 2002-2011).
5. Action RPG
Considerado um dos jogos de maior sucesso no mundo nos últimos tempos, Dark Souls (PS3 e Xbox, 2011) fez o mundo gamer tremer com seu nível de dificuldade há muito não visto pelos Ocidentais.
O jogo expressa o que os japoneses sabem fazer melhor: criar dificuldades absurdas, porém instigantes. Este grau de desafio dificilmente teria sido implementado numa produtora Ocidental, devido ao modelo seguido pela maioria dos jogos daqui.
Outros jogos deste tipo são Demon’s Souls (antecessor do Dark Souls, 2009), Dragon’s Dogma (PS3, Xbox360, 2012) e Bloodborne (PS4, XboxOne, 2015). Mais uma franquia do mesmo gênero, porém muito mais amigável, é The Legend of Zelda, o jogo favorito de muitos nintendistas.
Contudo, sem dúvida, não há franquia mais bem sucedida no Japão nos últimos tempos do que a série Monster Hunter. O jogo consiste em várias missões onde o seu objetivo é caçar criaturas com suas armas.
Para avançar, você se utiliza de materiais obtidos dos corpos dos monstros, originando diversos tipos de armas novas e estilos de luta. Por fim, há a abertura para o modo cooperativo, onde até quatro jogadores podem caçar juntos criaturas mais difíceis. O jogo requer estratégia e preparo.
OK, você já sabe quais os gêneros mais populares do Japão, mas é aí que chega a pergunta:
E os jogos indie?
O Cenário Indie Japonês
Em diversos lugares você verá, como o anunciar do próximo apocalipse, como a indústria de jogos japonesa “vai mal”, e como o mercado Ocidental “está superior”.
Essas críticas são resultado dos poucos jogos que os japoneses estão conseguindo exportar para o outro lado do mundo.
No entanto, o que estão carimbando como “a queda da indústria de jogos japonesa” é, na verdade, o espelho de sua maior mudança nos últimos tempos.
Os japoneses ficaram muito tempo representados pelos consoles devido a maior facilidade de trabalhar com essas plataformas do que com PCs. No entanto, a chegada dos smartphones deu um novo florescimento ao mercado, porque abriu espaço para “outro portátil”: os jogos de celular e as App Stores.
O Japão está mudando de um mercado dominado por consoles para um mercado mobile, e seus maiores representantes atualmente são as empresas Gree e Dena.
Um evento que mostra claramente isso é a TGS (Tokyo Game Show). Em 2010 haviam 423 jogos para consoles e portáteis em exposição, contrastando com 141 à mostra para smartphones. Apenas dois anos depois, em 2012, esse número virou. Os dispositivos móveis constituíam 507 jogos, enquanto que os consoles e portáteis ofereciam 210 títulos.
Não é nem preciso dizer o quanto os jogos indie ficam cheios de oportunidades com este cenário. Há um grande mercado em crescimento neste sentido.
Uma prova disso é o jogo de MMO gratuito para PS3 Gundam Battle Operation (2012): o jogo foi lançado em Junho de 2012. Dois meses depois, em Agosto, a desenvolvedora Namco Bandai conseguiu cobrir todo o seu investimento, pois o jogo já havia feito cerca de 60 milhões de dólares.
Se pararmos para pensar no mercado dos arcades, que sobrevive basicamente a partir de moedas de 100 yenes (um dólar), não é de surpreender que jogos gratuitos baseados em microtransações obtenham sucesso.
Simplesmente os japoneses estão acostumados a fazer pequenos investimentos para potencializar o seu lazer. Muito mais do que qualquer outro lugar do mundo, talvez lá seja o lugar mais fértil que os jogos indie conhecerão daqui a alguns anos.
Comentários Finais (por Raphael Dias)
Chegamos ao fim da nossa série de artigos sobre a carreira de games no Japão!
Eu tenho certeza que se você um dia já pensou em trabalhar com games no Japão, essa série de artigos reascendeu essa vontade.
No decorrer dos 4 artigos nós falamos sobre:
- 6 razões para tentar uma carreira de jogos no Japão;
- Como estudar games no Japão;
- Como trabalhar com games na industria japonesa de jogos;
- Como montar um currículo apropriado para o Japão;
- Como montar um portfólio nos moldes japoneses;
Entre muitas outras coisas.
Espero que tenham gostado!
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